Mercado de Carbono no Brasil: Aspectos Jurídicos da Lei do SBCE
- 06/01/2025
- cristiano
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Com a promulgação da Lei nº 15.042/2024, estabelece-se um marco importante para o Brasil na transição para uma economia de baixo carbono. A criação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE) representa não só um avanço regulatório, mas também uma abertura de novos caminhos para que empresas e setores se adaptem a esse contexto econômico e ambiental em transformação mundial.
Criação do SBCE e suas Diretrizes
Da leitura da legislação, extrai-se que o SBCE surge como uma ferramenta para regular a comercialização de créditos de carbono, promovendo a redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE) de maneira estruturada e transparente. Além disso, a lei adota princípios como transparência, segurança jurídica e promoção da competitividade econômica, fundamentais para dar robustez e credibilidade ao sistema.
O SBCE também estabelece medidas específicas para grandes emissores, que precisam adotar planos de redução de emissões ou compensar suas emissões excedentes adquirindo créditos. Essa mudança representa um impacto regulatório significativo, especialmente para setores intensivos em carbono, e exige um planejamento estratégico para atender às novas diretrizes legais.
A análise a seguir é um apanhado feito a partir dos aspectos legais que identifiquei serem os mais relevantes neste primeiro momento, e que as empresas precisam entender para saber quais são os impactos da nova legislação no seu dia a dia.
Obrigações e Necessidade de Inventários
A legislação traz obrigações claras para empresas, e estabelece a régua de emissões que estarão sujeitas à regulação:
- acima de 10.000 tCO2e (dez mil toneladas de dióxido de carbono equivalente) por ano, para fins para fins de elaboração de planos e envio de relatórios específicos;
- acima de 25.000 tCO2e (vinte e cinco mil toneladas de dióxido de carbono equivalente) por ano, para as mesmas obrigações do item anterior, incluindo a conciliação periódica de obrigações.
Para saber em quais obrigações estarão sujeitas, as empresas serão obrigadas a elaborar um inventário detalhado de suas emissões, baseado em metodologias reconhecidas e auditáveis. Esse inventário é crucial para que as autoridades possam verificar o cumprimento das metas de redução e identificar a necessidade de compensação ou adoção de medidas mais efetivas.
Para aquelas que não atingirem essas metas, o sistema prevê mecanismos de compensação, como a compra de créditos no mercado regulado. Esse mecanismo permite que as empresas busquem alternativas viáveis para cumprir suas obrigações enquanto reavaliam processos internos para melhorar sua eficiência ambiental.
A não conformidade pode trazer penalidades severas.
Mercado Financeiro e de Capitais
A lei inova ao qualificar os ativos do SBCE como valores mobiliários (Lei nº 6.385/1976), submetendo os referidos ativos a registro e regulação pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Governança e Regulamentação
A governança do SBCE é centralizada em um Comitê Interministerial (CIM), com competências executivas e normativas para o órgão gestor. Um ponto relevante é a criação do Registro Central do SBCE, que assegura o rastreamento e a transparência.
Infraestrutura Jurídica de Projetos de Créditos de Carbono
A titularidade e os direitos sobre os créditos de carbono gerados são detalhados com clareza. Segue alguns pontos importantes:
- Direitos de Propriedade: A titularidade originária é assegurada a proprietários privados, indígenas e outros povos tradicionais, em respeito a autonomia sobre o uso das áreas.
- Proteção Socioambientais: Os projetos devem seguir critérios rigorosos para evitar impactos negativos, incluindo consulta prévia a comunidades afetadas.
- Registro de Contratos: Contratos entre geradores e desenvolvedores de créditos de carbono devem ser averbados em cartório de registro de imóveis, conferindo maior segurança jurídica.
Implementação Gradual e Período de Transição
O SBCE será implementado em fases, permitindo um período de adaptação para empresas e agentes regulados, com períodos dedicados ao relato inicial de emissões e à implementação do mercado.
Incentivos às Tecnologias Verdes
A Lei nº 15.042/2024 apresenta incentivos relevantes para empresas que investem em inovação e sustentabilidade. Projetos que promovem a redução de emissões ou o sequestro de carbono podem se beneficiar de deduções fiscais e de financiamentos em condições vantajosas.
Esses incentivos criam oportunidades valiosas para empresas que desenvolvem tecnologias verdes, como soluções de captura de carbono, energias renováveis e práticas sustentáveis no agronegócio. Além disso, a legislação fomenta a destinação de parte das receitas do SBCE para a promoção de tecnologias de baixo carbono, reforçando o compromisso do Brasil com o desenvolvimento sustentável.
Sanções e Penalidades
As penalidades previstas são significativas e incluem advertências, multas de até 3% do faturamento bruto (ou até 4% em caso de reincidência) e suspensão de atividades. A gravidade das infrações e a reincidência são fatores determinantes na aplicação das sanções.
Conclusões Preliminares
É importante ressaltar que este texto não se propõe a abordar os aspectos técnicos do SBCE. Para isso, recomendo a leitura do artigo do Professor Bruno De Rosso Ribeiro no LinkedIn, que traz uma análise detalhada dessa dimensão.
Meu objetivo aqui foi oferecer uma reflexão preliminar sobre os desafios e oportunidades jurídicas que a Lei nº 15.042/2024 apresenta e por que é essencial que as empresas compreendam os impactos dessa nova estrutura regulatória.
Concordo com o empresariado no sentido de que mais uma lei vem para onerar e impor obrigações no processo empresarial, mas também não se pode negar que é preciso olhar o SBCE como uma oportunidade para as empresas alinharem suas estratégias a um futuro mais sustentável e inovador, principalmente diante das catástrofes que estamos vivenciando em decorrência das mudanças climáticas.
Embora ainda estejamos em um período de adaptação, considero que este é o momento ideal para as empresas avaliarem sua posição no contexto do SBCE. Saber se estarão obrigadas a compensar emissões ou se poderão gerar receita com a venda de créditos de carbono pode ser determinante para a definição de suas estratégias, evitando, também, as penalidades previstas na nova legislação.
Cristiano Prestes Braga – Advogado. Mestre em Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia para Inovação (IFRS). Pós-graduado em Direito Processual Civil (ABDPC).
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